Quando jovem, cultivava uma arte: a dança. Adorava ir a bailes e ali permanecer até quando fosse possível, deliciando o bolero com bons parceiros. Era a alegria de sua juventude e foi nesta alegria que encontrou o companheiro eterno de sua vida, pelo menos eterno enquanto o amor durou.
Fazia cerca de doze anos, era viúva. Não contrariando sua personalidade, mantinha no guarda-roupa apenas uma camiseta azul de seu marido. Quando a saudade chegava a um limite impossível de manter a aparência sólida, discretamente pegava o cabide, sentia o cheiro de seu homem, relembrava bons momentos e voltava aos seus afazeres.Hoje encontrava-se ansiosa, já que para ela era importante prestigiar os eventos culturais que sua irmã mais velha promovia. É possível perceber o porque dessa atitude, sendo sua irmã, sangue do seu sangue, ela via tudo que um dia sonhou em ser na vida nela e se sentia realizada com suas conquistas, era como um reflexo.
A família toda daquela senhora a acompanhou ao evento. Ali ela encontrou suas duas irmãs, ambas casadas e de súbito uma nostalgia tomou conta do seu ser. Isso era visível apenas por quem a conhecesse muito bem, talvez por alguém que estivesse grandes semelhanças com aquela jovem senhora.
Ao longe, como um fundo musical, um bolero tocava e criava no ambiente um contexto de décadas passadas. Dois casais, no espaço em frente ao palco, flutuavam em uma dança intensa. A senhora se virou e em seus olhos se via uma explosão de sentimentos. Talvez saudades, pezar, mas acima de tudo uma alegria de se imaginar também ali, nos braços de alguém que outrora lhe proporcionara as danças mais belas de sua vida...
Foi a única vez que vi o escudo no chão e uma lágrima dolorosa cair dos olhos de minha avó.
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